Resenha — Mansfield Park — Jane Austen (1814)

Marcela Antonechen
3 min readNov 19, 2020

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Mansfield Park publicado pela Martin Claret

Parte da boa graça de ler Jane Austen, encontra-se na figura da heroína protagonista. Geralmente, uma jovem quase adulta, dona de uma língua afiada e possuí a coragem de desafiar figuras de poder e autoridade em frente dos costumes à época. No entanto, Mansfield Park é um ponto fora da curva.

O romance de formação (aqui sendo totalmente minha opinião após ler), retrata a infância e juventude de Fanny Price, uma mulher de alma boa, princípios inerentes a qualquer cobiça ou ambição humana e, surpresa, pobre. Após um ato de caridade de suas tias — Lady Bertram e Sra. Norris, será essa menina de nove anos quase dez contemplada com a oportunidade de ser educada e crescer com oportunidades de um bom casamento.

O enredo do livro é centralizado no amadurecimento dela, junto de seus primo mais velhos, e o início dos relacionamentos no ambiente familiar com os recém-chegados irmãos Bertram.

O romance é guiado por questões morais a medida que os casais se forma. Fanny ama Edmund, seu primo quase seis anos mais velho, porém, Edmund ama Mary Crawford. É nesse triângulo inexistente, pois Edmund apenas vê Fanny como uma irmã, que a história fica presa. Além disso, há também a questão moral levantada pelos flertes de Henry Crawford às primas de Fanny, Maria e Julia, e após isso o fato que Henry apaixona-se por Fanny.

Enredo de novela cercado de críticas à sociedade da época e da figura feminina? Agora sim, temos um livro de Jane Austen em mãos.

É quase um balaio de gato, mas em resumo, os personagens são confrontados com os dilemas morais que envolvem seus sentimentos; passando isto desde da escolha de profissão (Mary e Edmund), até o fato de casar-se com alguém para esquecer outro alguém (Maria, prima de Fanny).

No desenrolar da história, é normal perceber que os personagens de Masnfield Park não são tão odiosos quanto os de Orgulho e Preconceito, e sim parecem-se mais com pessoas reais. A própria, Fanny é uma protagonista mais real. Ela tem inveja e ciúmes, gosta de fazer corpo mole às vezes, porém, em momentos tem a bondade e dedica-se à Lady Bertram mais que as próprias filhas. Mas você se pergunta, e onde entra Fanny em seu papel de heroína da história?

E é exatamente nas questões morais que Fanny Price será aquilo que lhe foi destinado. Ao ser confrontada com o amor não requisitado de Henry, Fanny é fiel aos seus ideais, mantendo-se focada em seu objetivo: amar o homem que tem seu coração, mesmo que não haja verdade na recíproca.

Uma recusa da promessa de amor e demonstrações como são tratadas no livro, não são meras cenas. Talvez seja para nós em 2020, mas não em 1814. Com essa sutileza e delicadeza, Jane Austen constrói uma protagonista doce, porém ciumenta. Uma protagonista mais próxima da realidade, que falha, que acerta e principalmente busca o melhor para si e a todos que ama.

Mansfield Park retrata muito mais além de um roteiro de novela com personagens e cenas curiosas, traz lições de morais e princípios, valores que não podem ser medidos facilmente. Também traz críticas sobre a responsabilidade da figura feminina; uma crítica sobre a retratação do lar familiar de forma “divina”, e principalmente, sobre como o amor deve ser fácil e não com obstáculos.

Nota: 4,5/5. Leitura: novembro de 2020.

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Marcela Antonechen

Bacharel em Direito, barista de final de semana. Escrevo memórias, a vida e um pouco de leituras.